Trocar casamento e emprego com carteira assinada para ser feliz fazendo o que gosta é o tipo de decisão que a lateral Neném toma sem nenhum peso na consciência. Nos campos há mais ou menos 20 anos, sua trajetória não é muito diferente do que já sabemos sobre futebol feminino: é um meio difícil, cheio de preconceitos, sem o reconhecimento que o masculino tem; mas quem faz, é porque tem amor por aquilo.
“Quem gosta de jogar futebol não tem nada que lhe impeça de querer correr atrás disso. É uma coisa que fala mais forte. Eu desisti de jogar bola uns meses atrás e fiquei praticamente numa depressão, porque nada tava me satisfazendo. É sempre um vazio. Quem gosta sempre sente um vazio dentro de si. Não tem como. Pode ser o maior dinheiro do mundo, você sempre vai dar um jeito de jogar. Fala muito mais alto. Por isso que tem muitos que falam que futebol feminino é por amor, não por dinheiro”, destaca.
Natural de Salvador, moradora do bairro de São Marcos, Rosimeire Souza dos Santos ganhou o apelido de Neném por causa de um hábito que muito médico iria aprovar. “Minha mãe botou [esse apelido] porque eu mamei até os 8 anos de idade, aí eu era menina grande que ficava mamando”, explica ela.
O apelido pegou e a acompanhou em todos os times pelos quais já passou, como o Campomar, Vitória, Bahia e São Francisco, até chegar ao Galícia/FTC. Para sustentar o sonho de crescer no futebol, fazia o que dava. Já foi babá, para conseguir o dinheiro do transporte e ir aos treinos; trabalhou na construção civil, depois de terminado o estágio no Fórum Ruy Barbosa. Mas ela lembra com orgulho mesmo da época em que não precisava trabalhar em outros lugares e podia se dedicar exclusivamente às quatro linhas.
“A gente lá ganhava salário todo mês, então eu não tinha necessidade de estar trabalhando para poder me sustentar. Eu pude conseguir minha casa que eu moro hoje, pude ajudar minha família. Mas infelizmente eu não pude ajudar minha mãe, porque ela já não vivenciou isso, por ter falecido. Eu queria que ela estivesse viva para hoje estar vendo que o futebol feminino cresceu um pouco. Apesar das dificuldades, muita coisa mudou. Infelizmente eu tenho 36 anos e não vou poder viver o que o futebol feminino está trazendo mais aí, por conta da minha idade, que daqui a uns dias eu devo estar me aposentando”, desabafa.
Neném considera a aposentadoria lá para os 40 anos, mas muita água pode passar por debaixo dessa ponte, até pelos exemplos que toma pra si. Além do condicionamento físico, que é levado com seriedade, a inspiração da lateral, a jogadora Formiga, segue a carreira aos 41 anos e em 2019 se tornou a jogadora mais velha a entrar em campo numa Copa do Mundo Feminina. Um exemplo de que a aposentadoria não deve estar tão no horizonte assim. E Neném pondera isso.
“Ela tem 40 anos e hoje que veio ganhar dinheiro, porque antigamente ela era o fenômeno – ainda é -, mas não era reconhecida e valorizada. Hoje Formiga conseguiu contrato com time bom, então não se pode desistir dos sonhos. Enquanto eu tiver forças pra lutar, vou estar aí lutando”, observou, otimista.
O time de futebol feminino Galícia/FTC é patrocinado pela Rede FTC, pela Infinity Transportes e pela JDR.